Gardone Riviera
O
lago de Garda é como a vida, tem seus bocados de tudo. Em termos geográficos e
humanos. E sempre multidões. Ou quase. Que a elite verdadeira acomoda-se sem
atropelos, no Savoy e hotéis afins, em Gardone Riviera. Ali encontrámos uma
estância de veraneio, parca em turistas de pé descalço, e é provável que não
tenhamos sido escorraçados por nos reduzirmos a três gatos-pingados; se havia
confrades de ténis, máquina fotográfica e mochila às costas, a conjunção dos
astros destinou-os, nessa hora, ao eclipse total. Que gente bem não faz
estrilho audível; fala baixíssimo olhando-nos em estranheza como se espécimes
raros, uma ruga a crescer entre o sobrolho; e, num estreitamento de olhos,
atenta para si em imperceptível
desagrado, “que faz o povo aqui”. Isto, é claro, sem alterar o perfil de
esfinge barrado a creme e ouro (ou será a cremes de ouro…). Além disso, os
próprios empregados, todos de farda, nos estranhavam sobranceiros. Fomos uma
curiosidade não desejada. Suportável.
Privilégio
maior, Gardone namora uma ilha no meio do Garda e a beleza da paisagem abisma
(não há dúvida, eles sabem escolher). Os hotéis à beira de água proliferam em
competição de beleza e galhardia florida. Tão bonitinhos e solenes! Ali se
senta, em contemplação, a nobreza de título e também a que o dinheiro trouxe,
que o poder económico ordena desde que o mundo é mundo. Contudo, o Savoy, em
branco e azul, é lindeza exterior a que nenhuma foto faz jus; há um inédito que
ciranda na leveza da sua aristocracia rendada. Aproximámo-nos da entrada – que
tem coroa e tudo - e pasmámos frente às
fotos do interior; nos quartos, o pasmo agarrado a camas-íman. O Alberto a apontar
uma, comedido, sim senhor, o estilo é clássico. E eu, pespineta estarrecida, mas o que é isto, o que é que
esta gente faz quando se deita, cada cama parece uma mesa de casamento… E a Lina para mim, em espanto retinto, isto é uma cama?!, e desatámos em riso imoderado,
a fleuma aristocrata a enrugar de leve em suas cadeiras de palhinha clássica.
Perturbá-los. A eles. Que repousavam de nada fazer, em semi voto de silêncio,
mesinhas viradas ao Garda a pontuar de refrescos e outras lisuras de fim de
tarde. E no poente que descosia irisados violeta, a nitidez atmosférica
inundou-nos na subjacência do seu despotismo envidraçado, Deus, como o povo é
estúpido. Ignorei a pose daquele classicismo rebarbativo e desatei a
fotografar-lhes os candeeiros e a calma das gaivotas. Como se não fosse nada.
Vou começar a ler amanhã, miga :)
ResponderEliminarCom calma para saborear tudinhoooooooo.
Beijinho
Hummm...pois sim.
ResponderEliminarBj