As
mulheres da classe média baixa são mulheres de primeira água e deixam na vida a
sua obra de nozinhos e arabesco, um primor mais celestial que nuvem de bilros. Não existem nós iguais. A beleza mora na
obra das mãos perseverantes que se atiram aos imbróglios da vida, os suam e
mastigam e, qual caracol, segregam um desenho.
Elas
desenham quando pegam no pincel e na trincha e pintam as paredes de casa, os
muros, as portas e janelas, os móveis velhos que mudam de cor e são outros. Criam grandes murais nas festas de família e nas outras quando
se deitam ao fogão e só desgrudam depois de tudo pronto. Contornam e arredondam ângulos quando, diárias, destinam e fazem almoços e jantares, aviam marmitas de
trabalho, lanches de infância e dos outros. Plantam flores em
jarra nas tardinhas de canções e histórias, e sempre que se debruçam a ensinar os filhos a
cumprir na escola. Esculpem
quando passam a casa a pente fino
espreitando-lhe as miudezas, avivando recantos, adivinhando feridas iniciais,
pondo pensos e remendos. Pintam quando saem a compras lembrando
faltas, a bolsa a desviar de apetites. Enfeitam quando a época de
saldos descola e elas se erguem acima das tentações. Deixam uma
doçura ambiente se compram o que gostariam de ter e desistem de
um gosto por quem julgam merecê-lo.
Às
mulheres da classe média-baixa pouco sobra de tempo ou economia para supérfluos, e
nas revistas cor de rosa lêem o mundo que não lhes coube nem entendem. Que vêem
com curiosidade de viagem ao circo: habilidades sem sedução, que não aprenderam.
Tenho a certeza que, se um impulso da natureza as levasse a todas num repente, havia um buuummmm monumental, a
classe média-baixa caía abrupta. Elas, como
acontece a todo chão que pisamos, não são reparadas.
A
minha esperança não é que as reparem. Quero que se extingam. Que surjam outras
e novas mulheres. Sem ombros de Hércules. Que tanto músculo já chateia. A elas.
“Beijinhos
à prima que a prima já sabe” (terminar a leitura do texto com esta expressão;
para o efeito, usar de tom displicente e um franzido de lábios que acentua no
inferior e acompanha com o devido trejeito de cabeça)
PS:
sorry, não resisti a rematar com o que na minha infância assinalava o desinteresse por falta de
novidade no discurso.
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