domingo, 12 de agosto de 2018

As Mulheres que Eu Conheço


O mundo das mulheres que conheço é herança de pobreza encardida e séculos de canga. Nele, os homens, apesar do incontestado  poder e domínio, são erráticos e relativos e não permanecem substancialmente. Ajudam na procriação; carregam, a meias ou sozinhos, um ou outro objecto mais pesado; vão ao café e demoram-se em conversas de amigos; fazem um recado caseiro só por desfastio e fama de ajudar e, por vezes, são  encarregados de educação dos filhos para assinatura ou mostra em reuniões escolares. Em amor, os mais cordatos fazem uso de ternuras avulsas que são caminho de urgência amorosa e um “não” desperta asperezas e amuos de duração indeterminada. Os mais, ou tomam de apetite o que consideram que o casamento fez seu, sem discussão, ou, mais raro, contrariam a ancestralidade e em tudo agem por amor. É verdade que eles trabalham fora de casa, mas elas também. Como é verdade que são elas quem faz a gestão caseira incluindo determinar, comprar e confeccionar as refeições. Os homens chegam fartos e cansados do trabalho que, vá-se lá saber porquê, é sempre pior que o delas. Elas não, elas chegam e enfiam uns trapos. Em seguida, vão para a cozinha preparar jantares e almoços, tratam dos filhos e vigiam-lhes os estudos, lavam-nos e preparam roupas e lancheiras do dia seguinte. Jantam à pressa porque ainda falta isto e aquilo, não vêem TV, não se sentam na sala, não sabem de outro mundo. A sala é o reino dos homens que, sendo bons maridos, não saem à noite, vêem TV. Os homens deitam-se cedo porque o seu trabalho exige e precisam descansar. Elas ficam a remendar o fato de treino do mais novo, a regar as flores que estão quase mortas de secura, a fazer aquele bolo que a do meio pediu para a quermesse da escola. Quando elas se deitam, eles ressonam. Elas caem num coma que o despertador interrompe. É outro dia. (cont.)

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