Andei
que tempos a pensar no filme desconhecendo-lhe o conteúdo, mas crendo o contrário.
Assistira à mostra numa sala de cinema e convenci-me que versava a relação
mãe-filha. Ora, Cate Blanchett é mais valia, actriz exemplar e fascinante, à
moda antiga, bem escolhida para dínamo de um filme sobre os anos 50. E a outra personagem
feminina parece-se estranhamente com Audrey Hepburn, o mesmo ar de garota
ingénua e sonhadora, rostinho miúdo, olhos grandes e, ainda que não do castanho
profundo de Audrey, com a mesma frontal fixidez, franjinha curta e figura
delicada. Pensei que ambas mereciam o risco.
E desgostei. Falta ao filme aquele
cunho de verdade plástica e emotiva que toda se esparrama no desempenho e na
história de “The danish girl”. Certo, não é o mesmo problema. A realidade não
está aos gritos, é toda encenada, servida quase a frio. Pois, mas não é só
isso. Carol dá-nos uma visão muito estereotipada e pouco real da
homossexualidade feminina. De como era ser lésbica no meio do século XX. O
filme desenvolve-se por conflito de três qualidades de amor: marital, maternal
e lésbico. Acontece que sobretudo os dois últimos não parecem convincentes.
Digo eu, na mera perspectiva de observadora que nada entendo de filmes, música,
realização e pormenores técnicos pasto de experts. Carol é alta burguesia e move-se em ademanes de lady homossexual com conhecimento do marido que continua
a a amá-la. A dado passo, o beber excessivo dele é atirado (e ilustrado) como uma espécie de
desculpa da senhora, sempre em seu pedestal, para o afastamento físico. O que nos deixa quase a simpatizar
com ele. Porque não sabemos, em definitivo, se beber não é a base que o ajuda a
suportar a situação difícil a ambos. Pelo visto, ela satisfazia-se sexualmente
e ele não. Afinal, a lady tinha/tivera um caso duradouro com a melhor amiga, continuavam
a encontrar-se Parecem naturais a proposta de separação e o ciúme
masculino misto de raiva e frustração. A futura partner amorosa, a que a fita desenvolve, é empregada de loja. E ali se conhecem até
evoluírem para a cena concreta – de cama - que me lembrou a vez em que um garoto
bebeu vários copos de vinho e depois eu o vi sair aos ziguezagues e vomitar roxo
mal chegou à rua. Náusea.
E o amor maternal também falha.
Quantas mulheres do século passado - e mesmo deste -, sob proibição de visitar a
filha até à conclusão do processo de divórcio em que ambos requeriam custódia da criança, arriscavam começar
entretanto uma relação proibida e que, a ser descoberta, faria pender a balança
para o lado paterno. Muito poucas. E os motivos estavam à vista: o processo não
ia durar assim tanto. Como não durou. Mas Carol não fica tão devastada como
qualquer mãe normal, pergunto-me se será pela distância educada que a aristocracia mantém em relação aos factos. E vai, romanticamente, espairecer com a sua conquista enquanto espera a audiência no tribunal. Ora
também na relação entre as duas mulheres há qualquer coisa de estranho e
desigual que pouco nos faz pensar em amor. Há um domínio claro de Carol, um
cumular de atenções que nos desvia do amor, quase parece um processo de sedução
banal, um fetiche. À cena de cama falta magia, sinceridade, mas concedo, pode ser a náusea a
impedir-me a clareza.
E depois há um remate que julgo
mauzinho e que pouco convence. Um desprender para que voltes, a que falta
sentido e onde a primeira ex é causa eficiente. Como se realizador ou
argumentista ou quem seja, queira dar a entender o papel da escolha, propondo, “se
vieres vens pelo teu pé, portanto agora é cada uma à sua vida”. Depois, na
primeira reunião do processo de divorcio, por dignidade e amor à criança (diz
ela), Carol abdica voluntariamente da
custódia da filha. Afirma que também para poder realizar a sua natureza.
Mas
continua faltando alguma coisa. No final, quando segundo parece as duas são
livres de alma e corpo, o chamado parte de Carol. E fica tudo bem apesar de um
ou dois momentos de hesitação da garota.
Isto
não é nada, menina Cate Blanchett! Estás bem em qualquer lugar, mas como é que
entraste nesta farsa do século XXI toda Lauren Bacall a contracenar com a
Audrey disfarçada. Então?!... Assim não vale. As lésbicas mereciam melhor. E
tu. E eu. Mas talvez nem tenhas direito a ralhete. Talvez quem realizou (ou
quem escreveu) seja como eu, espontaneamente toldado do juízo e no afã de
querer incluir muito sentimento não se tenha debruçado verdadeiramente sobre
nenhum.
Olha,
não me pareceu consistente, queres o quê.
Mesmo assim tenciono ver...:)
ResponderEliminarMesmo assim tenciono ver...:)
ResponderEliminarAcho bem:) Até porque Cate Blanchete dá um show de representação e é um charme ambulante o filme todo. Os filmes com ela são mais ela que eles.
ResponderEliminarAcho bem:) Até porque Cate Blanchete dá um show de representação e é um charme ambulante o filme todo. Os filmes com ela são mais ela que eles.
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