19 de Setembro de 2012
Vieira
da Silva no Museu da EDP, Porto. A exposição
inicia com fotos que lhe traçam o curso do corpo, e onde ela surge sucessiva,
o olhar de pássaro a alargar no inexplicável. Fica-nos o espanto em que os
olhos flutuam, como se a realidade uma coisa grande demais para a pintora. Entre tanta
fotografia, fixei uma do casal. Arpad e Vieira da Silva estão juntos no sofá,
o ângulo recto das pernas em paralelo perfeito. Dois velhos quotidianos, se não
fora serem eles. E nos corpos sentados uma sintonia de abraço imaterial, estar
de dois que são um. Olho-os melhor. A Harmonia entre aqueles dois seres é
acerto que transpira sem efusão. Lado a lado, os quatro pés denotam uma paz
ainda amorosa.
Pouco
entendo da pintura de Vieira da Silva e nunca tinha apreciado “O Enigma”. É um
quadro que me fascina, todo construído em quadrados brancos e pretos, que joga
tudo na cor e tamanho das formas geométricas. Observado a alguma distância,
emerge-lhe uma ave de asa aberta e, contudo, nada nela é de voar, de todos os
lados cadeias a seguram, como se lágrimas cristalizadas lhe tolham o vôo e
impeçam que se destaque por inteiro. O quadro vive de uma falta de distância
entre espaços, origem da imprecisão das imagens e que acorda no observador a
radicalidade do insolúvel. Enigma é um nome que lhe assenta.
Desconheço motivos para ter circunscrito as notas a uma foto e uma pintura. Mas foi assim que encontrei o rascunho, nas costas de um bilhete de comboio, as palavras a esvoaçar em volta dos pequenos círculos que assinalavam a passagem do revisor.
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