Estamos
a um mês do Natal e vou, como sempre, comprar-te uma prendinha que tu agradeces
com um telefonema que só fazes por essa mesma razão. Sem prenda, não te lembras
de me ligar. Há gente escrava de causalidades necessárias. És como és, sou como
sou.
Quando
os achaques me percorrem o corpo e parece que tudo em mim sossobra, penso em
ti. Também por seres mais velha. Como te darás com a velhice, que órgãos te
ameaçam de dentes arreganhados, dores como cães de má fila. Quem te socorre.
Talvez a prima te mime na doença. E chego mesmo a julgar-te mais acompanhada
que eu, o que nem é difícil. Nas famílias há uma inadvertida distribuição de
papéis e no meu a doença pouco conta. Na verdade nem tenho ideia do que conte.
Será talvez a certeza da disponibilidade, coube-me aplanar o caminho de todos. Cada
vez mais sou uma árvore. E olha, nem sei onde encontrar forças para mais um
Natal. Não faças caso, é apenas a doença a falar. Quem sabe em Dezembro estou
boa e tudo se faz e passa como sempre. Que não é bem.
Como
sabes, a morte não é estado que tema por aí além (aquele momento da passagem,
sim, deve ser difícil). Como Sócrates, julgo que seja um apagar definitivo. Um
nítido nulo sem ponto de nitidez. Que me agrada, viver cansou-me demais. O
eterno nada parece-me seguro. E não julgues por isso que o desejo. Não. Estou
disponível para ele quando queira vir. É só.
Não
tenho forças para mais mudanças na minha vida. Não que ela me seja fácil ou
agradável, mas é a que me pertence. Já vivi a desejar um emprego, alguma coisa
que me tirasse do buraco, me desse uma hipótese de pensar em mim de outra forma;
a desejar uma casa em qualquer lugar do mundo. Mas hoje tudo que pretendo é continuar
a sobreviver sem depender de ninguém. Não pesar. Se possível, ser leve até na
morte.
Sei,
não estou natalícia. Mas hei-de. E oxalá te sintas bem, que o bem estar dos que
amamos ajuda a compor o mundo.
Um
beijinho doce
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