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Filme de 2000 |
É
um filme de amor e tormento. E primorosa elegância. Os sentimentos nascem e
evoluem sem contacto físico e, como em todo o amor, numa crescente necessidade
de presença. Ambos sabem que os respectivos cônjuges são amantes
e se encontram juntos no Japão. Mas o que em americano faria um filme de final
feliz é no império do sol nascente um desenho de tinta-da-china em papel de
arroz: pura delicadeza sugestiva. Os dois abandonados alugam quartos em
apartamentos vizinhos. Ele, intencionalmente. E começam por fazer-se companhia,
juntam mágoas quase desabitadas de palavras, a tentar o entendimento de como se
chega à traição e à mentira que vivem. Ele pretende nela a vingança, quer ajudá-la
a desmascarar o marido. Impressiona o sofrimento daquela mulher e não é
explícito se apenas por humilhação. Entretanto, ao espectador começa a ser
claro que o inquieta aquele sofrer calado num corpo de bissectriz; e começa ali a
gostá-la sem propósito. O realizador filmou em contenção de palavras, gestos…mas
foi pródigo em beleza e silêncios; e o corpo no silêncio é mais atroz, na
escuridão qualquer luz é mais. O sintoma do amor é essa necessidade de estar
com, que se insinua como um aroma, primeiro sub-reptício e depois consentido,
ansiado; uma necessidade de presença tão forte que é a medida da intensidade.
Não se beijam. E que me lembre só uma vez se abraçam. E no entanto procuram-se,
telefonam, passeiam, comem juntos, ela dorme enquanto ele trabalha… E quando o
amor diz quem é, a inocência recolhe-se. Começam a esconder-se dos outros e
dão-se conta de copiar quem criticavam, mentem para o mundo. E ele resolve
afastar-se.
Mas
não morre amor por quilómetros de permeio.
No
final, ambos procuram o lugar onde se encontraram. Ela, que tem já um filho, encontra a casa para venda e compra-a. Quando ele regressa, também visita quem lhe alugou o quarto,
mas o proprietário é já outro. Depois, pára na porta da casa dela, sabendo
apenas que tem novo locatário. Mas não bate. E, por falta de um gesto, as vidas
dos dois continuam exteriores.
Gosto
de pensar que o filho é dele, ainda que o filme em nada o indique. E que, quem
sabe, ele volta atrás, bate à porta. E o amor flui. Mas a vida não é cor-de-rosa.
Fica a memória.
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