De pincelada larga e vivaz, Sorolla é pintor de fino recorte, gente que não
chega a descer das sedas mesmo quando parece que sim. Os seus retratos
femininos deslumbram e não apenas pela pintura, há nas modelos certo ar gourmet
que entontece. É certo que a mostra em exposição se subordinava ao título "Sorolla e a Moda", o que afastou telas como a do pescador morto e que titulou , "ainda dizem que o peixe é caro".
O pintor tendia para a beleza qual flor para a luz, mulher feia ou assim-assim jamais o levaria. Talvez um dos poucos homens que gostava e sabia comprar vestuário e calçado feminino. Em solícita e amorosa carta a Clotilde, sua esposa (exposta no museu), pede as medidas para compra de roupas que viu e lhe ficarão muito bem (um elogio maior em letra esquinada a tinta permanente de qualidade, que ainda não debotou); refere ainda a aquisição de chapéu para uma das filhas e sustém que são compras a seu jeito. E que gosta e lhe dá prazer alindar as suas mulheres.
O pintor tendia para a beleza qual flor para a luz, mulher feia ou assim-assim jamais o levaria. Talvez um dos poucos homens que gostava e sabia comprar vestuário e calçado feminino. Em solícita e amorosa carta a Clotilde, sua esposa (exposta no museu), pede as medidas para compra de roupas que viu e lhe ficarão muito bem (um elogio maior em letra esquinada a tinta permanente de qualidade, que ainda não debotou); refere ainda a aquisição de chapéu para uma das filhas e sustém que são compras a seu jeito. E que gosta e lhe dá prazer alindar as suas mulheres.
Deparar a gente com um Sorolla pode ser grande sorte. Mas também um azar. E
se ele era um chatíssimo senhor, daqueles de, veste lá o vestido que te comprei
e põe os brincos x ou y; e não esqueças, calça os sapatos z. E agora repousa
nessa cadeira e olha-me desta maneira, não, assim não, que te faz uma ruga na
testa e te dá um ar zangado; e põe o braço assim, levanta só um pouquinho da
saia a mostrar o pezito. E agora fica quietinha para fazer o esboço. E etc.
Sim, que aquele deus grego – era bonito até fartar – casou com uma mulher
linda que pintou em mil posições e feitios. E duas filhas bonitas que também
eternizou em tela. Contudo, uma das jovens é portadora de inquietante tristeza.
Não há quadro onde a melancolia do olhar não nos perturbe. Li que teve
tuberculose. Talvez lhe tenha ficado desse encontro prematuro com a morte, há embates
que nos mudam o semblante. Apetece pegar-lhe nas mãos e olhá-la por dentro. Sem
querer que fale ou se abra. Basta deixar correr a melancolia que traz presa no
olhar.
Mas
há ainda a casa. Um solar airoso, pensado em beleza requebrada. E de duas casas se fez uma. Obras
e mais obras que o pintor concebeu. Rasgo de janelas mirando o primor do jardim
onde os buxos convivem com as fontes e a pérgula e as flores são felizes. O
conjunto é tão bonito e pueril que parecemos mergulhar num filme ou história de princesas. Tudo é muito
e demais. Pode ser ilacção ilusória, mas
Sorolla denota certo horror à pobreza de onde saiu, uma obstinada fuga ao submundo
e que condensa na obsessão pela harmonia, nos gostos caros, na exigência da justa
proporção.
E
pode que nada do que penso seja verdade.
Sem comentários:
Enviar um comentário