sexta-feira, 13 de abril de 2018

Na Fundação MAPFRE


Ed Van der Elsken é o mais importante fotógrafo holandês do século XX. Assim. Sem mas nem mas. E a retrospectiva do seu trabalho é agradável de ver. Na fundação se expõem fotos, filmes, livros. E a vida pessoal do fotógrafo, que, sem exaustão, quase delicadamente, vamos surpreendendo pelo mundo. Salientam-se as fotos das suas musas, que foram variando – suponho que teria vivido com cada uma pelo menos aos bocadinhos.
 Lá está a moda e seus apaniguados. E os anos sessenta em Paris e Tóquio estão tão bem que admiramos as cabeçorras das jovens fotografadas como se tivessem defeito. Mas não. É apenas ripanço de cabelo (estão lá os carramiços e tudo) encimado por lacinhos hoje fora de época e sobrevoado por muita laca. Um ninho de vespas. Portanto. E há aquelas três bonecas de mini saia, avançando perna no cruzar da rua. Divertidas e cabeçudas. Como compete. Tudo na objectiva de Ed surpreende, mesmo que aceitemos casos de surpresa com ensaio. Há uma sequência de fotos de uma jovem japonesa, muito séria, corpo elegante, nem bonita nem feia, fixada em algum percurso específico que só ela sabe. E que – parece –, não deu pela objectiva. O efeito surpresa empresta a alguns fotografados certo ar zombeteiro, um desafio no olhar, estou aqui, interesso-lhe e tu não. E há droga. E álcool. E olhos que não enganam. E os mafiosos que sem esforço se adivinham. E as mulheres de vida alegre, como dizem nuestros hermanos. Vida alegre! Não podiam encontrar expressão mais malvada. É que não há razão que a sustente. Mas enfim. Avante.
E há filmes. Alguns no propósito de chocar. Como aquele com a sua primeira musa, um abuso de asas de corvo no risco dos olhos. Ela e o parceiro enchem a tela, um acto de amor descarado, vertical e divertido, cheinho de solavancos. E só a juventude dos dois permite que não seja boçal demais. E, em fundo, constante, a voz e o riso dela a contar o espírito há muito enterrado e que, então, os animava. E há África de que ninguém fala mas existe, cheia de maldade para com as mulheres, e era lugar das preferências fotográficas de Ed. E Tóquio com sua carga de exotismo e contradição, onde não se cansou de voltar.
            No final, a mensagem de despedida ao mundo e à família. E a coragem de se filmar com doença terminal. Não o vemos morrer perante a câmara. Mas basta olhar e sabemos o que ele sabe:  falta pouco.

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