sábado, 28 de abril de 2018

Museu Thyssen


O museu Thyssen-Bornemisza  percorre-se de gosto. Visita cosida a linha de vagares,  as primeiras três ou quatro horas  passam  quase inadvertidas.  Nem daríamos por elas, não fora as pernas queixosas do carrêgo e  da proximidade ao ponto morto, num pára-arranca em contínuo gaguejar.  Faltam-lhe as obras espectaculares do Reina Sofia, mas cumpre em requinte. O turista julga que entra para uma refeição ligeira e depara com mesa de palácio posta a preceito, rendas de Veneza, talheres de prata, limoges e cristais a emoldurar iguarias inestimáveis em suplante de sabores,  qual de paladar mais delicado. O folheto recebe-nos também em português, pormenor tanto mais agradável quanto estranho nos museus de Madrid. Na capa, a enigmática Giovanna de Ghirlandaio, uma seráfica e aprumadíssima jovem, perfil  clean e penteado à la mode, num arranjo de arte capilar que lembra o uso de postiço em cabelo naturalmente ondulado; que podia mesmo ser enfeite do nosso tempo em cerimónia festiva. Havendo interesse na cronologia pictórica, podemos percorrer os vários períodos e começar pela pintura antiga dos mestres italianos, passando depois ao Renascimento e Barroco. E a arte do retrato manifesta-se em todo o esplendor renascentista, ali brilham os Caravaggio, Carpaccio e mais. Sente a gente que os olhos ficam reféns das telas, desligados de nomes, técnicas ou períodos. Não conhecem, são olhos que sentem. Fruem.  Se houvera tempo, então sim, talvez eles se desviassem da grata contemplação para comparar, distinguir, catalogar. E depois vêm os impressionistas, pós impressionistas e expressionistas, todos de elevado quilate e fino gosto, ímans do olhar , quais medusas sedutoras e ondulantes.  Prendeu-me Corot e o “Banho de Diana”; mas ainda Degas, Van Gogh, Gauguin, Renoir, Monet e tantos mais a que não quero ser infiel e para que me falta memória. A finalizar a viagem, a pintura do século XX onde cabem cubismo, abstraccionismo, surrealismo, pop arte... não que meus olhos distinguissem estilos, empenhados que estavam na fruição. Mas por tê-los lido antes e conhecer mesmo alguns, Kandinsky, Dali, Kirchner, Edward Hopper. E outros que ignorava e me enriquecem o imaginário despidos de nome. O que esta gente fez por mim não tem paga. Talvez a arte seja isso, o imenso trabalho de mostrar a centelha divina que nos habita ajudando outros a entender-se nela, fazendo-nos inclusivos. E desse entendimento resultará a misteriosa pulsação da vida. Estamos todos ligados.

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