Os
portugueses amam a boa mesa. Diz-se. Ora, os objectos de apreço surgem-nos
quase sempre conjugados. E à mesa, para ser boa, cabe conjugá-la com companhia
despretensiosa. Pode ter parentesco. Ou não. Ser amizade de longa data. Ou
simples conhecimento. Mas quase arriscava que é fora dos tête-à-tête que vogamos
à bolina, esquecidos do emaranhado da vida. Uma refeição em grupo é outra
coisa. O grupo afasta maus olhados, auras negativas, negrumes de tristeza. E eu
que não sou de fermentações alcoólicas, afirmo: o escudo do grupo é potente. E
digo isto porque, na antevisão de um jantar, nos demos o braço e enfiámos no metro ainda meio tristonhas.
Mas, cá fora, na Lisboa anoitecida, entrou-nos a alegria de nos revermos juntas
no chuvisco miúdo. As mesmas e não as mesmas. Passou-me um lampejo do tempo em
que pouco atentávamos na incógnita do futuro. Que sopro a nossa juvenil
eternidade! Parámos, como então, a olhar montras, tu a dar sugestões sobre
roupa, que agora és entendida. Vogámos sem pressa pela Baixa, eu, vê tu a
parvoeira, quase comovida, a lembrar pressas nocturnas até ao barco, a pasta a
bater-me nas pernas, o rio escurecido ao fundo da rua deserta, um ou outro
automóvel vagaroso a avaliar-me e eu julgando-os turistas perdidos, quase com
pena de quem rola a esmo por uma Lisboa desconhecida, quem sabe a procurar
quarto. E por entre estes devaneios barbados, ficámos três. E logo seis. À
mesa. Que o grupo esvai a vida individual, mas não elide o indivíduo. Nele, cada um é si mesmo, expurgado da vida
que lhe pertence. O teu grupo de uma vez por mês, minha amiga, é esse oásis. Um
clique que nos desata. Fez-me sentir parte antiga quando era nova. E durante o
agrado da janta, houve brinde “a nós e aos novos!”(eu, eu!); acrescentei, “e a
todos os que não estão aqui e gostam de nós”. E depois o tempo correu sem
darmos conta e surprendemo-nos uns com os outros, o grupo convida os lados
menos triviais de cada um. E pasmei com algumas coisas que ouvi e nem sabia e
nem pensava. Como as pessoas podem ser diversas - e mesmo perversas - nos interesses, nos gostos, nas
aspirações. E depois da despedida, eles seguiram juntos e nós juntas viemos.
Até que um comboio nos levou em separado.
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