quinta-feira, 15 de março de 2018

Olívia


Tenho saudade a ser Primavera e ir Alentejo fora.  Não apenas de ti. Do caminho. De eu numa recta quase deserta, a penetrar no interior sem invadir, mansamente, como quem entra em sua casa após o dia de trabalho.  Saudade de rodear aquela igreja de barras  tão nossas, onde em dia soalhento me acoitei a descansar da torreira que esparramava sem dó pelo Largo, o ar numa tremura. E não parar. Continuar rodando, sabendo que me esperas. Não com o mesmo anelo. Nem semelhante. Quem sabe se isenta dele, forçada à minha presença. Quem sabe.
Nunca me visitaste. Não escrevias ou sequer respondeste alguma vez às minhas cartas compridas. Se ligo, raro me atendes. Ofereço-me para uma visita e logo prorrogas, adias, empurras. E eu mato-te por fora, que amizade assim é desvalor. E interno-me em penas e lamentos. A falta que tu me fazes! Claro que tenho mais duas ou três amigas, senhoras de sua casa e seus narizes, mulheres a sério. Claro que conheço outras pessoas. Mas não são tu. Não viveram comigo dois anos de sonhos a fio, um dia atrás do outro comendo na mesma mesa, estudando na mesma sala, dormindo no mesmo quarto. Entre nós duas a afinidade combatia a solidão que já então rondava a porta de cada uma.  A gente que vou conhecendo é outra gente. Mais expedita. Mas também mais distante. Gente cheia de “amigos” e trechos de conversa dispensável,  encontros que não são a sério e onde não acerto bem com o papel, mas deve ser de ouvinte. Gasto horas do meu tempo a ouvir dissertações e interesses centrados. Conversa solipsista, sem um raminho estendido, assunto que nos una. Perguntarás porquê. Porque sou carola, porque tenho esperança em sintonias que ou não existem ou desistem. Porque os outros não são gerânios à minha janela. Enchemos a boca com o valor da amizade; dizemo-la deep e ficamos na superfície. Que pena! 
Fazes-me falta. Mesmo sem cartas. Sem visitas. Sem corpo. És uma ideia em mim. Mas qualquer dia é Primavera, arrebanho-me por inteiro, pego no carro e meto pés ao caminho. A ver se abraço a minha ideia de ti antes que toda se(me) desmanche. Porque te preciso, queres o quê?! Pode ser que não queiras ver-me. Mas juro que finges na perfeição e pareces sempre contente de mim. Por favor, repete; torna mais uma vez. E hei-de sustentar a tua crença de que eu sim, sou feliz. 
Mas primeiro tens que atender o telefone. E depois tenho de te convencer à minha presença.

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