quinta-feira, 6 de março de 2014

Dallas Buyers Club

(continuação)


O melhor actor secundário em 2013 é Jared Leto pelo desempenho de Rayon, “a drug addicted Trans woman with AIDS” (wikipedia), que estabelece uma sociedade com Woodproof na distribuição de medicamentos alternativos; a Rayon cabe grangear a clientela. A personagem ganha-nos de imediato. Prende-nos a força desaparafusada dos olhos azuis e o tom leitoso da pele, ingredientes de uma quase inocência cósmica que soçobra e ajoelha sem luta perante a droga. Que faz cama à provocação de exibir a mulher que em si mora. Ao longo do filme, o personagem não renasce, não lhe emerge uma réstea de esperança, antes persevera na ausência de salvação pessoal. Impressionante caminho.
 Ao contrário de Woodproof que esbraceja e sonha até ao fim, sempre a arrastar outros no sonho, que ganha seis anos aos trinta dias prometidos pela medicina, ele não empolga. Limita-se a passear o seu olhar azul pelo filme como anjo caído progressivamente em desgraça, sem uma queixa. Mas também sem um plano, uma perspectiva, um sinal de desejo. Também ele a emagrecer –  emagreceu 30 quilos – e como que preso a um destino inexorável que o vai sugando. O que Woodproof rejeita, Rayon entrega. E a sua entrega é tão patética que nos enovela o âmago. Contudo, nunca abandona Woodproof e palpita no seu único gesto desejante a extensão da mágoa e do amor, o peso esforçado de vestir “à homem” na visita ao pai, a fim de obter verba que ajude o amigo.
Tudo nele vai cedendo, desistindo, até não ter coragem para injectar-se e ser o amigo a fazê-lo. Nesse balanço que os filmes dão a quem os assiste, palpamos-lhe a desistência e a nostalgia secretas, quando se abraçam quase no final, depois da oferta do dinheiro que é balão de oxigénio no projecto.
Depois encontra um companheiro tão patético como ele, aturdido, quase vegetal. Porém, o medo da morte permanece inexplicável, imune à desistência de viver. E, se nós vislumbramos em Rayon os sinais de um afecto maior, Woodproof não os detecta. Chegando de uma viagem, a morte do amigo choca-o profundamente – quanto pomos de propositada ilusão naqueles que gostamos -  e chora o companheiro de anos, aquele que, dentro dos parâmetros em que viveu, esteve a seu lado. Os dois respeitando o que o outro era na sua liberdade.
E, contudo. Todos os que assistem o filme, sabem desde o início, pelos olhos de Rayon, que a tragédia o habitava.
Deste actor multifacetado que fotografa, escreve e canta e tem uma banda – ou teve –; que realiza; que já tem um activo de papéis vários e aclamados; que tem fama de se deixar submergir pelo personagem a que dá vida e desaparecer como si mesmo enquanto o personagem dura; que é obsessivo com a interpretação; que prima por um visual empático e angelical: auguro uma vida longa. Que, a haver, nos brindará com bons momentos. 
Tchim- tchim!

Nota: Mas. Porque. A verdade é que discordo destas atribuições. O meu melhor actor principal é Leonardo di Caprio; e o secundário, sem sombra de dúvida, Fassebender. Porque são excepcionais, com desempenho extraordinário. O que emana deles é de outro quilate. 

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