terça-feira, 14 de junho de 2016

Uma Viagem a Bracara Augusta

Instalámo-nos e, no vago espírito do investigador em férias que não depôs tiques profissionais, verificámos camas, ambiente geral de armários e gavetas, e casa de banho. Depois, calçámos sapatos baixos e fomos curtir a rua. Cá fora, o dia, subindo ao patamar das doze, aprimorava. E, para onde nos voltássemos, uma ou várias torres de igreja, braço em viseira sobre os olhos, que é como quem diz sobre os sinos, espreitavam-nos, hirtas de autoridade pétrea, bisbilhoteiras. Por detrás das casas, policiavam circunspectas e interrogativas, que é que querem, vocês. E os sinos numa indiferença ao sorumbático da pedra, bem vindas, dlim-dlão, dlim-dlão, dlim-dlãããooo. E ficavam a retinir em gargalhadas alegres  que traziam à alma efeitos  de tangerina eflúvia. Nós gozando o prazer raro de nada a fazer, isenção de compras e nota de faltas, o eu a subir em quarto crescente. Doces momentos de receber a novidade e transformar o que os sentidos acabidavam. E a envolver, a certeza de muita hora à nossa espera. 
Excepção feita à Sé, todas as igrejas e monumentos fechados. Feriado nacional. Impossibilitadas de interiores, flanámos por jardins e praças, ruas coloridas de esplanadas vivaças e a borbulhar de dolce fare niente, feirinhas disto e daquilo, pares de namorados que se atardavam no beijo, a estátua que não viam num orgulho parolo a protegê-los, escolheram-me. E nós em solilóquio, sorrindo da ternura empedrada, então, nunca mais acaba o cumprimento, queremos fotografar. E eles mais concentrados em si que um matemático na sua equação, submersos em humidades com ventosa, que floresciam na pele como líquenes. Desistimos e fotografámos as ruínas em arcada, uma rosa a pendurar sobre mim num pedido desajeitado, também quero ficar na fotografia. Fiz-lhe a vontade. E lá está a sua atenção de flor vigilante virada às pequenas ogivas. Descemos a Rua Central para apreciar as tíbias que me chamavam desde a manhã e eu já não encontraria se não fora a mana. Boa aposta. O trabalho dos pasteleiros regalava os olhos e entumescia bocas hipotéticas, as papilas incrédulas, posso? A mana entusiasmada à vista da diversidade, tão apetitosos e bonitos, vou só olhar para eles, satisfazer a visão. E aproximou-se das fileiras cerradas. Um exército alinhado contra a dieta. Sucede. Quando o serviço de pastelaria tem esmêro, há pingos doces que nos reclamam do seu breve de lágrima; brilhos cetinosos que entontecem o gosto e despertam saliva; crocantes de massa folhada que o maxilar deseja e a boca apetece, os dentes no avanço involuntário de uma trinca; fatias húmidas e túrgidas que se oferecem impúdicas ao corte suave da faca a deslizar sobre o corpo macio que dá passagem em movimento de anémona. Um tudo de tentação. A pecaminosa pastelaria de Braga.  

Mas cedo nos recolhemos, em consumição de cansaço e novidade. Mais doces que pudim do Abade de Priscos. Noves fora, nada. 

Sem comentários:

Enviar um comentário