quinta-feira, 4 de junho de 2015

Volantes Que Me Fazem O Ser

De súbito, um condutor solitário passou perto, lentamente. Em inspiração repentina, saltei para o rebordo traseiro do carro dele e agarrei o pau comprido que faz o contacto eléctrico na rede sobre a pista. O jovem não se apercebeu da minha acrobacia e fiz bem umas duas voltas naquele esterlaio, desejando que se abeirasse das passadeiras laterais, os meus folhos cor-de-rosa todos empolados, calculo que o cabelo a ir para trás e possivelmente uma data de gente a pensar, o que é que aquela maluca anda a fazer santo Deus, há cada uma…. Eu, atrapalhadíssima, continuava ali, de pé que nem bandeira inusitada, sem saber que fazer. E, de repente, os meus amigos passam por mim, vêem-me naquela figura e caem na risota de tal forma que enfileiram com uma data de carros (castigo divino, sem dúvida). Aí eu acordei para a realidade e, com conhecimento de causa sobre choques desamparados, saltei para dentro do carro: uma perna, depois outra e pumba, sentei-me. Impecável. Olhei o meu companheiro, lindo, muito aprumado. Era Setembro e os meus folhos subiram talvez demais, mas nem pensei no bronzeado a destapar. Apenas mirei o meu abismado companheiro a quem, a meio de uma volta, caiu uma rapariga cor-de-rosa no assento do lado. Por sobre o chinfrim, enveredei por afogueada explicação, avançando que vinha agarrada ao varão já há duas voltas e era melhor sentar-me antes que um maluco qualquer se entusiasmasse a fazer-me cair. Se ele riu foi para dentro, porque me fitou atento e breve e logo se quedou compenetrado na condução. Guiou tão mas tão bem que não chocámos uma única vez e me pareceu até caminho de estrada, sem cheiros que detesto, as buzinas de repente longe, a milhas de nós. Voltei a agradecer-lhe no final da corrida e segui para junto dos meus amigos que, feitos  parvalhões, riam a bandeiras despregadas. À conta deste episódio, ainda hoje oiço troças descabidas. Abandonaram-me à sorte e não se coíbem de piadas brejeiras. Ó injusta e cruel mente juvenil que ainda neles estrebucha.

Não voltei a encontrar aquele rapaz que bem se podia chamar Salvador. Não perguntámos nomes e desaparecemos um ao outro. Mas é indubitável: ficou em ambos este comum assimétrico, esquisito lendo-se o u. Engraçado, vá.

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