O
que mais me conquistava nos livros de Enid Blyton nem era o enredo, a aventura.
Era a sensação de segurança e bem estar que se desprendia do seu todo. Uma
segurança feita à medida do mundo em que viviam aqueles garotos, antípoda do meu. Não só os pais eram óptimos, toda a sua realidade o era. Se passavam numa
quinta, ali havia mesa posta com um lanche, sumos, gelados, bolos, scones, etc;
os seus rituais quotidianos, alimentares, de sono, de passeio e diversão, galvanizavam
qualquer, eram ideais. Repare-se que, no subterrâneo mais negro, havia sempre
uma lanterna; se estavam presos em algum lugar, encontravam paus de chocolate
no bolso, bocados de cordel que eram suficientes para subir desde o fundo de um
poço...como eu invejava aqueles bolsos. Enid Blyton foi o Aristóteles da
aventura infantil, fez descer o maravilhoso do mundo dos duendes e fadas para a
terra dos homens e seus apetites. Depois, os bons ganham sempre e os maus
sofrem castigo; e, por norma, são feios, o mau carácter devidamente identificado.
Agatha
Christie criou a sua versão dos cinco, mas para adultos. Menos linear. Bem
posso desculpar-me afirmando que Poirot é uma série inglesa, fiel à época e aos
detalhes, motivos da minha preferência; Midsummer murders também é, e não faz igual
mossa. Sou obrigada a reconhecer o meu lado de piroseira: gosto daquele mundo
meio feudal, talhado a damas e lordes irrepreensíveis, moradias (solares e
castelos, há muito castelo habitado por aquelas bandas) a que não se apõe uma
nota de rodapé, jardins a estourar beleza. Mundo de pessoas bonitas e
inteligentes, distintas na maioria dos casos, servidas por meios de transporte expensive e empregados obedientes que
não destoam da condição e se apagam na trama. É básico, a história recai sempre
sobre quem está bem de vida. Como em Enid, há um mundo bonito e de alto nível,
onde os acontecimentos se desenrolam; e os maus são castigados. Eis o
maravilhoso de Ágatha Christie. A ler, ou a ver e ouvir, eles rodopiam em meu redor;
contudo, permaneço invisível. Oh! Claro. Há o mistério que a escritora tão bem soube
construir, mantendo-nos intrigados até final. E a figura bem cinzelada de
Poirot. Ou Miss Marple. Ou a vivaça Tuppence e seu par. E há as mortes. Que
importam tanto como os subterrâneos em que os cinco ficam prisioneiros: são
acidentes de percurso, sem dano para o espectador ou leitor. As pessoas vão
sendo assassinadas, mas todos tocam a sua vida; como nos cinco, a aventura tem
de continuar, nada de paragens piegas no enredo. Acontece como nos contos,
saltamos levemente sobre.
E
quem não gosta de uma aventura que se torna enigma e onde o que é bom aparece
requintado e o pior tem tal leveza que não é ele?! Que atire a primeira pedra.
Mas só daqui a poucochinho que vou abrigar-me primeiro. Ou será antes preparar-me para ver novo episódio...
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