No
momento em que – oxalá – a esquerda portuguesa se faz à terra com o arado e a
direita roga pragas à rabiça, pois neste precioso “momento interessante da política”,
ainda com a aura de alguma esperança, apetece-me outra coisa. Por me apetecer.
Neste
rumo de inconfidências, reconheço que banhar-me num episódio de Poirot antes do
telejornal, desencarde (dois em um: solta-me as cardas ao mesmo tempo que lava). Existem mil maneiras de nos
contarmos. Por que não com os romances policiais? Os de Agatha Christie agarraram-me
aos vinte anos e não descolam. À época, a dama inglesa conseguiu mesmo uma
vitória sobre a praia. Em férias – cinco
brevíssimos dias -, após ler um dos seus livros, decidi levar de empreitada
toda a colecção da dona da casa. Dias e noites a ler em maratona. Adormecia com
uma senhora dor de cabeça ansiando a manhã em que, fresquíssima, me atirava à
página assinalada de véspera, em anelante pressa de amante insaciada. Quando,
com grande pena, terminou o breve período de lazer, ainda os meus propósitos
estavam longe da metade, a pele amarelava como antes, e a praia, meu supremo
enleio, era-me estranha (tentei juntar as duas modalidades mas desisti;
portanto, 1-0, perdeu a praia). Perguntava-me como é que até à segunda década
de vida vivi alheada do entusiasmo presente no romance policial, coisa tão
idêntica ao ar que se respira. Mas a verdade é que desconhecia a sua existência.
O mais parecido que tinha lido eram os livros dos cinco. Mas os amores levam-se
até ao fim, esgotam-se sem se esgotar. Ágatha Christie foi a causa primeira da
mania que me nasceu de coleccionar livros por autor. Durante anos, perseverei
em coleccionar-lhe títulos, andava com a lista na carteira e tinha supremo
prazer na compra, antevendo horas inefáveis. Durante uns anos, esta fixação
facilitou as poucas prendas que recebi. Os títulos que ora me faltam, são os
que li nas férias da nossa apresentação amorosa que logo me incendiou em paixão
a perder de vista. Confesso que me desilude comprar livros que já li; portanto,
é possível que a prateleira da estante mantenha essas faltas ad eternum. Entretanto, comprei livros
policiais de outros autores. Mas nenhum destronou a dama inglesa. Aghata
Christie é a minha queen.
Quando
(me) surgiram os filmes baseados nas obras, não desiludi. Até hoje,
perguntei-me que sorte de ingredientes detêm livros e filmes para despertarem tal empatia. E só agora, nesta hora precisa –
também não penso assim tanto no assunto –, descobri o que sempre esteve em
frente dos meus olhos: estes livros e filmes são muito particulares. E, hélas!, chama-me neles (aos gritos) o
exacto mesmo que me chamava nos livros dos cinco. Não têm nada em comum?! Ora
essa, mas é que têm mesmo. Vejamos.
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