segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Estrela de Natal

Agora sou criança. Criança de escola a fazer uma redacção das antigas. Porque quero. E posso. Sou quem me desejo e não me interessa se sou mesmo ou só finjo. Neste preciso momento estou “nas tintas” para a essência  - das coisas e minha -, que aliás não existe senão como ideia (a tralha que acumulamos, santo Deus!), jamais alguém viu uma essência por aí, lhe palpou a carne ou fez cócegas; a essência não cheira a nada e dela não se ouve um resmalhar. É um conceito, portanto. Onde não cabe a minha estrelinha brilhante. De Natal?...hummm...nem tanto. Diria que a minha estrela é de ano inteiro. Mas no Natal brilha mais e mais me interpela. Empurra-me. Cutuca-me. Faz-se até importuna. Mora tão dentro de mim como o Menino Jesus de Pessoa, mas não é de carregar no colo. E o nosso  términus é a morte. Curiosamente, eu que dou nomes palermas a tudo de que gosto, não lhe dei nome, vive tão comigo que prescindimos nomeação.  A minha estrelinha não nasceu da fractura de um sol cósmico, mas de um buraco humano. Isso mesmo, em cada homem há um buraco propositado, uma reentrância da alma inspirada nas covinhas da bochecha que algumas pessoas fazem a sorrir e onde Deus planta uma semente de estrela. Depois, mães, pais e outras pessoas tratam dela e ajudam-na a ser luz – toda a gente sabe que as estrelas não crescem, ganham brilho -. Sei que a minha estrela não é única no mundo senão para mim, mas também sei que é a única estrela que pertence aos homens e que a podem  tratar com os cuidados de um principezinho a olhar a sua flor e a varrer a cratera de um vulcão minúsculo. É uma coisa tão bonita, ter uma estrela cá dentro! Basicamente, o trabalho dela é brilhar nas outras pessoas; é assim mesmo que pertence, a minha está em mim e ilumina mais os outros. Faz-me vê-los. Inspira-me a dar o que gostam e precisam. Sussurra-me ideias para agradá-los. É por ela que os meses são menos compridos e os dias mais leves – vai dando palpites para este ou aquele aniversário, esta ou aquela pessoa que vi ou senti mais precisada de cuidado. Só assim os meus Natais valem a pena. Houve um tempo em que íamos as duas às compras de Natal e eram dias felizes esses em que procurava e levava para casa o que eu mesma gostaria de ter. Hoje não posso arriscar tal luxo e  servimo-nos de outras artes, cuidando de não as repetir em cada pessoa.  E o meu Natal é sempre muito tempo, o que, bem vistas as coisas, é uma grande sorte para mim. Vivo-o ponto a ponto, em cada gesto da caneta, no desenho das letras mais simples, em cada prescindir, os agrados pessoais a tombar de leve. Tenho verdadeira pena das pessoas que abafam a sua estrela. E de quem lhe desvia o brilho com cheques e contributos para gente que é um número, ficando fora da sua alegria grata, desperdício de sol que não lhes bate na alma. Também são necessários, sim. Mas dar é mais. Por incrível que pareça, a estrela rebrilha se haja troca e presença. Porque o agrado de dar  nasce na alegria de quem recebe e cada prenda se sustenta na reciprocidade: o que sentimos pelos outros e o nosso gesto desperta neles. Portanto, as prendinhas de Natal são encontros de bem querer. Sem este fundo de boa vontade, não há estrela que se aguente.

Bom Natal!

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