sábado, 13 de dezembro de 2014

Cartas a Olívia

Olívia

Escrevo-te por me apetecer. Sempre e apenas porque sim. É certo, vou aproveitar para me inteirar sobre o que pensas dos homens. Não casaste. Houve um rapaz que te gostou e de quem, talvez, tenhas ameaçado gostar. Porém, as saias da mãe muito compridas; as tuas irmãs com mãos demasiadas, todas estendidas para ti; a casa de teus pais a necessitar-te a carteira. Imagino que tenha sido assim. Mas, quem sabe, foi diferente. Quem sabe, não arriscaste provar braços masculinos, um beijo, um ardor compartilhado. Fizeste mal. Não to digo na cara, face a face, seria muito mau porque já não emendas nada, és já outra depois de tanto ano. Nem eu torço por torturas gratuitas, remorso, dor a mais.
Acredito que, mais tarde ou mais cedo, te chegaram os  anseios de toda a gente. Sim, porque eras normal (ainda deves ser, apesar de abolido o assunto) e a qualquer mulher chegam os anseios da paixão. Os do amor não sei. Amor é sentimento que exige presença e só cresce com ela. Não precisa ser física, mas tem que existir. Ou será mera fantasia, cuja serve também na mesa da paixão. Em amor, se venha só, a fantasia esboroa, não se aguenta de pé.
Imagino-te a vida sintética: tratas da tua roupa e da casa sempre limpa, pouco cozinhas porque não gostas e nem sabes, as manas poupavam-te sempre, temes o silêncio nocturno do lar e foges a dormir num quarto que não é teu (não entendo esta parte, palavra). Sempre só. Sorris por fora das graças dos outros, a ouvir-lhes contar a lufa-lufa dos dias.
E tanto que não sabes. Desconheces o calor de uma companhia mais íntima, não imaginas a que cheira a pele lavada de um homem jovem, os teus dedos não se cruzaram com a elasticidade firme dos braços, não os descalçaste qual gueixa a palpar-lhe a incomensurabilidade dos passos no músculos da perna, não tiveste o ensejo de ser grata à vida por um corpo junto ao teu, a mimá-lo. E isto, Olívia, sempre lamentarei em ti. Sempre. Não. Não é não teres casado. Não é estares sozinha. Estamos todos sozinhos, Olívia. Num momento ou noutro. Ou até talvez sempre.
Não vês? Faltam-te memórias felizes. Memórias de corpo e alma. Que te pertençam por inteiro e guardes como tesouro que ninguém pode retirar de ti. Foi sempre essa a razão que me fazia desculpar, imaginando que te compreendia.
Mas isto sou eu a pensar-te. Quem sabe, és feliz na igreja (com a comunidade,  como dizes), e no trabalho que desenvolves em prol de reuniões que só são absurdas para mim.
Mas, realmente, penso agora, que sabes tu dos homens para além do corriqueiro das mulheres, que é dizerem-te mal deles e me desinteressa...Sobre o género masculino não és senão de escutar. E não me apetecem momentos confessionais. Dou-tos e a teus padres.
E no entanto, passaram-me na vida alguns excepcionais. Não porque fossem santos, ou mesmo bons. Somente porque o amor é sempre uma excepção. Se queiras, para ti que vives imersa em água benta, um acto sagrado.
Porta-te bem e não mastigues a hóstia que é sacrilégio J
PS: desculpa, mas um bocadinho de humor ficava-te bem. Falta-te à piedade:))

Beijinho

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