Na Margem do Garda
O
pensamento colado à lembrança macia do areal português e em desábito de tal
grau de humidade abafadiça, visitámos o Garda. Suarento. Amodorrado. Muito concorrido. A tarde, pedindo
sombras e água fresca, abeirou-nos da água e das gentes que como nós o demandavam.
Muitos banhistas avermelhavam à torrina.
Passámos por eles sem inveja, implorando frondosidades e frescuras de brisa que
no Garda inexistem. Tudo é quente. Nas sombras, que abundam, há um calor
insidioso a colar em todas as coisas e as pedras de bancos e muros escaldam
excessos. Ante tanto corpo a exudar, arrepiámos caminho, ávidos de gelados e
brisas. Os gelados encontrámos, que as brisas não coadunam com a itália de
veraneio. E sempre muita gente, muito automóvel de longo alcance, muita vida em
demanda.
Pode
ter sido excesso de multidão, de calor, de humidade. Mas em nenhum lugar
daquela margem do Garda se me insinuou a sensação de ameno quotidiano. As
localidades que visitámos namorando o lago, sofrem de multidão, são avassaladas.
Ainda que belas e cuidadas, prestam vassalagem, apoucam a alma. São zonas esquecidas
de dias de tudo igual a horas certas. É um pouco como se ali não haja vida a
crescer, só passagem contínua. E não é verdade. Mirei envergonhados salões de
cabeleireira, mercearias de bairro, farmácias, pastelarias. Talvez, fora da
época estival, ajudem os lugares a sedentarizar, os estruturem e personalizem.
No meio do vaivém de automóveis que passeavam
e soberbos se embrenhavam por aqui e ali, só nos veio à retina uma jovem
mulher-polícia de extraordinária beleza e bom porte que, no caminho para
Sirmione, nos obrigou a apear. Linda de morrer, suplantava manequins de loja e
até o suor lhe quadrava. A convulsão dos pés masculinos em inadvertida
travagem, abrandando de encanto, a língua mais lenta, a tartamudear uma
qualquer inutilidade, um redondo basbaque a solicitar a atenção expressa da
ninfa. E as signoras e signorinas ao lado.
Contentes da feminil eficácia em tão supremo embrulho. Também a
invejá-la. Sim. Porém, os três quilómetros que fizemos sob o calor, até ao
castelo de Sirmione, calharam mal. E porém. Viva a mulher-polícia mais sedutora
do mundo. Uma espantosidade no meio do alcatrão.
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