segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Um Agosto em Itália

Cumprindo roteiros de gosto, certa manhã de sol rumámos a San Marino, o estado mais antigo do mundo, informação à incipiência da minha geografia paleolítica. De caminho, namorámos Sant’Apollinare in Classe, basílica situada, como o nome sugere, em Classe (lê-se de e aberto), uma povoação  a cinco quilómetros de Ravena. O templo é dedicado ao santo que lhe deu nome e se passeia pusilânime e cordato na ábside central pastoreando ovelhitas num mosaico de verdes que debruam verdes, uma paisagem naif, em infantil desenho, árvores e arbustos cândidos, todos de igual tamanho, semeados pelo semicírculo da abóbada, as ovelhas bordejando a cena, em doçura. E é assim que damos por nós a invejar pastoreio e  serranias ventosas batidas de sol, nos imaginamos cabelo ao vento e cajado na mão subindo montes pedregosos em esforço, com aqueles novelinhos de lã atrás, mééé…méééé…seguindo-nos a musiquinha simples da flauta, um ou dois cães em rebuliço a encaminhar o rebanho  – Sant’Apollinare não tem flauta mas devia. Entretanto, tive de guardar no bolso o sonho profissional e o cabelo a esvoaçar  que a abside toda desmente, assim transformada em campo de concórdia e pacificação. Aquelas ovelhas são branquinhas, não têm carramiços de pauzinhos e plantas aqui e ali a empastar a lã malcheirosa (o cheiro a ovelhum é péssimo), não deixam caganitas por onde passam – o chão é todo verdinho claro -  e os olhos são potes de mel a escorrer; ora, toda a gente sabe que as ovelhas são animais sem tacto nenhum, que só não têm um olhar bovino por serem ovinos. E portanto. Já se percebeu que Sant’Apollinare in Classe nos sofreu o efeito de olhos habituados à contemplação de belos templos. Peço-te humildemente desculpa, Apollinare, mas o humano pensamento é assim, foge, foge, foge. Mas reconheço, estás lindo e digno, ergues-te a meio da abside sem subterfúgios e ocas vaidades. Podes crer. Fica descansado com a imagem.
Do dito, não se infira que a beleza da basílica, que data do século VI, seja menor. Todavia, apreciado San Vitale, todo o seguinte nos pareceu de valor encolhido. Em Classe,  os olhos prendem-se na extensa nave principal, o tecto suportado por vigas de madeira que se cruzam  com arte, a puxar por entusiasmos viajantes.
Uma característica de Itália é o facto das suas torres de igreja estarem quase todas inclinadas. E também a de Sant’Apollinare in Classe. Curiosamente, fala-se em inclinação e logo nos surge a torre de Pisa, mas ela é apenas “a de maior inclinação”. Que todas as outras, desde que bem antigas, pendem e pendem; os olhos desconfiados da paisagem, na interrogação originária, a torre está torta ou vejo mal. E depois,  rodámos até San Marino.

            San Marino é uma aldeia medieval toda metida em verduras e densidade de arbustos, elevada a umas boas centenas de metros. E o panorama que se avista do castelo é lindo. E verde. Com mar ao longe. Mas quanta gente encontrámos por lá. Quantas pessoas flanavam como nós, num calor de torrar, suando as estopinhas, descendo e subindo ruazinhas que compõem o centro e levam ao castelo e suas torres, uma pena no cimo de cada uma (não lhes conheço sentido, mas estão lá). E muitas, muitas lojas a comerciar. A vender. Tudo. Do típico ao atípico. Numa ciganice assaz italiana (usam idêntica técnica de engodo), isenta de impostos mas também sem benefício de promoções e preços baixos. Fartei-me desse lugar superlotado, muito dado a carteiras poderosas. O excesso de gente come-me o gosto, esfarripa-o como galinha a folha de couve. Ponderando: a haver um terço das pessoas, eu teria encontrado beleza a esmo, que estive um nico de tempo a descansar numa ruela e logo me apaixonei pela parede de hera que me ficava em frenteJ

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